Eleições 2014. Elegendo a democracia

Eleições 2014. Elegendo a democracia

83f4646ea00f2b1312dd7e0ffcaa6460.jpeg

ESCRITO POR PE. DR. JOSÉ EDUARDO DE OLIVEIRA E SILVA | 09 OUTUBRO 2014
ARTIGOS – RELIGIÃO

Nosso voto é uma opção pela democracia, rejeição a um esquema de poder que está aparelhando o Estado, gerando totalitarismo. Apenas isso.

Se todos fizermos como esses nossos irmãos, se não lutarmos contra os pagãos por nossa vida e por nossas tradições, eles em breve nos exterminarão da terra!
(1ª Mac. 2,40)

Realismo versus idealismo
Entre o real e o ideal há um hiato. O homem sensato o percebe, e sabe ater-se à realidade, enquanto busca transformá-la, transformando-se ele mesmo neste processo.

Entretanto, neste debate eleitoral, certo grupo bem-intencionado tem propalado sua própria perplexidade mediante um tipo de proselitismo pela abstenção, alegando como argumento o socialismo dos candidatos à presidência da república, favorecendo colateralmente a eleição da candidata governista.

Da teoria à prática
Não percebem estes que seu argumento, apesar de parcialmente verdadeiro, é fundamentalmente teórico. Com efeito, a ética e a política são ciências práticas, e servem-se de uma metodologia prática referenciada por uma medida distinta de bem: a ética regula-se pelo bem do indivíduo e a política pelo bem comum.

Prudência e circunspeção
Cada medida de bem engendra um tipo de prudência específico, que dispõe arquitetonicamente o agente para a sua consecução, ordenando suas ações para aquele fim: o bem pessoal gera a prudência pessoal; o bem comum, a prudência de governo. Num regime democrático, os cidadãos são requeridos para o exercício de uma certa medida da prudência de governo no período eleitoral.

Uma das partes quase integrais da prudência é a circunspeção.

“Visto que a prudência trata das ações particulares em que concorrem muitas coisas, acontece que algo que em si mesmo é bom e adequado ao fim, torna-se mal e inadequado a ele por algum elemento que concorra. (…) Por isso, a prudência necessita da circunspeção, para que o homem compare o que se ordena ao fim com as circunstâncias”.
(S. Tomás de Aquino, Suma Teológica, Ia-IIæ, q. 49, a. 7, respondeo).

Em outras palavras, o doutor angélico nos está instruindo para o fato de que as ações humanas são complexas, e precisam lidar com a contingência das circunstâncias para que seja consequente com o fim. Se isto vale para todos os tipos de prudência, quanto mais para a política, que precisa lidar com a imensa complexidade das escolhas pessoais e partidárias.

Saindo do simplismo puritano
A partir destes pressupostos, percebe-se mais claramente o simplismo puritano e suicida desta perplexidade supostamente mais ortodoxa. Alegar o socialismo dos dois candidatos iguala-os a partir de um coeficiente teórico a ser atuado com perspectivas práticas consideravelmente diversas, para não dizer contraditórias.

Antes, porém, de considerá-lo, queria apenas esclarecer uma questão canônica, ultimamente muito relevada: a da excomunhão dos comunistas e de seus cúmplices.

O problema da excomunhão
Advogando a excomunhão latæ sententiæ, algumas pessoas têm interpretado conjuntamente o Decreto contra o comunismo (Cf. Denzinger, 3865) e o cânon 1364, do atual Código de Direito Canônico, sem levarem em conta a correta interpretação deste último emitida numa nota de 13/03/2006, que estabelece as condições para se dar o ato formal de defecção da Igreja, com sua consequente pena, a excomunhão automática.

Neste, o Pontifício Conselho para os Textos Legislativos diz ser necessário que “o ato seja manifestado ao interessado de forma escrita, diante da autoridade competente da Igreja Católica” e, “por conseguinte, somente a coincidência dos dois elementos – o aspecto teológico do ato interior e a sua manifestação do modo como aqui se definiu – constitui o actus formalis defectionis ab Ecclesia catholica, com as penas canônicas correspondentes (cf. cân. 1364, §1)” (Pontifício Conselho para os Textos Legislativos, Actus formalis defectionis ab Ecclesia catholica, n. 5). Sendo assim, se a lei foi “modificada depois de cometido o delito, deve-se aplicar a lei mais favorável ao réu” (Código de Direito Canônico, c. 1313, § 1).

Em outras palavras, para se dar o delito de apostasia, o batizado precisaria escrever um ato formal de abandono da fé diante da autoridade eclesiástica competente (o bispo, o vigário geral ou o próprio pároco) e, deste modo, estaria excomungado automaticamente. Caso não cumpra estas formalidades, poderia até cometer o pecado de apostasia, do qual precisaria emendar-se pela confissão sacramental e reparação dos eventuais escândalos, mas não incorreria no delito nem na pena canônica. Neste sentido, o Decreto contra o Comunismo permanece válido em seus princípios doutrinais, mas sua aplicação jurídico-pastoral foi mais especificamente precisada pelo supremo legislador, visto terem-se alterado as circunstâncias de sua aplicação.

Desta forma, os que alardeiam que os que votarem nesta eleição estarão excomungados latæ sententiæequivocam-se enormemente por extrapolarem a interpretação autêntica das atuais leis eclesiásticas, emanadas pela competente autoridade da Igreja.

Resolvida esta questão, volto à anterior, a da circunspeção.

Ditadura versus democracia
No quadro atual, não temos opções realmente boas. Como tenho dito em diferentes ocasiões, nós já perdemos! A questão aqui é escolher racionalmente a opção menos danosa ao bem comum.

Antonio Paim, um egresso do partido comunista, escreveu que o PT, “chegando ao centro do poder, pelo voto, sob o eufemismo de criar uma ‘democracia popular’ – por sinal o mesmo nome adotado pelos satélites da União Soviética – cuidará de alterar, naquela direção, o sistema representativo que o País tem procurado restabelecer no período considerado” (Antonio Paim, O socialismo Brasileiro, Instituto Teotônio Vilela, Brasília 2009, p. 114). A mudança do regime já aconteceu, sob a inadvertência da população, pela instauração dos conselhor populares mediante o Decreto 8243/2014, da presidente Dilma Rouseff, que insere na administração pública federal conselhos não eleitos pelo sufrágio popular.

Portanto, nosso voto é uma opção pela democracia, rejeição a um esquema de poder que está aparelhando o Estado, gerando totalitarismo. Apenas isso.

Contudo, os que ficam flutuando nas nuvens do idealismo, murmurando a inexistência de um candidato conservador e escudando-se no comodismo de anularem seu voto precisam saber que sua omissão favorecerá o fortalecimento do comunismo no Brasil, e isto em ritmo acelerado. A oportunidade que temos, certamente não nos possibilitará parar a máquina destruidora da nação, mas pelo menos poderemos diminuir a sua marcha, e isto é responsabilidade nossa.

O exemplo dos Macabeus
A Escritura relata um episódio similar. Durante a invasão helênica, um grupo de judeus morreu por não querer lutar em dia de sábado. “‘Não sairemos, responderam aqueles, e não cumpriremos a ordem do rei, profanando o dia de sábado’. Então os perseguidores os atacaram sem demora. Mas eles não revidaram, nem uma pedra sequer lhes arremessaram, nem mesmo cuidaram de obstruir seus esconderijos. Apenas disseram: ‘Morramos todos em nossa retidão. O céu e a terra são testemunhas de que nos matais injustamente’. Assim mesmo aqueles os atacaram, em operação de guerra, em dia de sábado. E pereceram eles, suas mulheres, seus filhos e seu gado, ao todo cerca de mil pessoas. Quando Matatias e seus companheiros souberam disso, choraram-nos amargamente. Disseram, porém, uns aos outros: ‘Se todos fizermos como esses nossos irmãos, se não lutarmos contra os pagãos por nossa vida e por nossas tradições, eles em breve nos exterminarão da terra!’ Tomaram, pois, naquele mesmo dia, esta decisão: ‘Todo aquele que vier atacar-nos em dia de sábado, nós o enfrentaremos abertamente. Assim não morreremos todos, como morreram nossos irmãos em seu esconderijo” (1Mac 2,34-41).

O bom senso de Matatias e seus companheiros tirou-os das nuvens, do idealismo romântico e suicida de quem usa a lei divina como se esta conspirasse contra si mesma. Entre o martírio e o suicídio passivo há uma grande diferença.

Deus não se contradiz, e é por isso que São Tomás ensina que “incumbe ao sábio considerar a causa suprema pela qual julga certissimamente tudo” (S. Tomás de Aquino, Suma Teológica, IIa-IIæ, q. 45, a. 1,respondeo).

Lutando pelo direito de lutar
No mesmo idealismo delirante incorrem alguns anti-abortistas que apoiam o PT simplesmente alegando como argumento favorável ao suposto não abortismo de seu partido a sua própria pertença a este. Comportam-se eles como jogadores de futebol que jogassem pelo Brasil, mas dentro da seleção argentina.

Enfim, um pouco de realismo nos levaria a entender que não é possível omitir-se nestas eleições sem cooperar com o avanço da ditadura petista, às custas do sacrifício das famílias e das vidas não-nascidas. Seria lamentável que o descobríssemos, porém, apenas quando a desgraça estiver consumada. Com efeito, não estamos apoiando uma candidatura por ser esta confiável, estamos apenas lutando pelo direito de continuar a lutar.

f18dQhb0S7ks8dDMPbW2n0x6l2B9gXrN7sKj6v4dZ1HW8pTv1M3LQdS0N63Bt0PQFLCHW6wfSj71k1H6H0?si=4857034627350528&pi=d22c1ff2-fbe3-44d0-c00b-8555b64673c6