Crianças cibernéticas e a formação do pensamento

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04-11-2015
Crianças cibernéticas
Gregorio Vivanco Lopes

Todo bebê é um ser racional. Já antes de nascer, ainda no seio de sua mãe, temos ali um ser racional.

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Só que, como o botão de rosa, sua razão ainda não se abriu, nem a racionalidade está atuante. É apenas aos poucos, com o correr dos anos, que a flor da razão vai se abrindo à procura da luz intelectual, até que a criança possa ter um conhecimento suficientemente claro das coisas e, portanto, tornar-se responsável por seus atos.

Em que idade isso se dá? Pode variar de cultura para cultura e até de criança para criança. Alguns estabelecem como padrão a idade de sete anos, mas pode haver meninos ou meninas que já bem antes disso são senhores de seus atos; outros um pouco mais tarde.

De qualquer modo, é de suma importância que a criança vá recebendo uma educação que a estimule a raciocinar, a analisar as coisas que a cercam, a distinguir o verdadeiro do falso, o bem do mal, o belo do feio.

Tal educação não exige grandes esforços dos pais ou mestres, pois a criança já tem em si os pressupostos racionais para entender bem todas as coisas. É mais questão de incentivar, amparar, indicar o caminho e evitar os escolhos, que o resto ela faz.

É por isso que pode chegar a ser criminosa a atitude do adulto que condena a criança a permanecer longas horas diante de uma televisão, recebendo imagens atrás de imagens, sem desenvolver nenhum espírito crítico nem de análise. Isso equivale a uma camisa de força para a mente, pois atrofia a sua capacidade intelectual. Sem falar dos aspectos gravemente imorais.

O mesmo se dá quando, desde muito cedo, iniciamos a criança no uso torrencial da cibernética, condicionando então seu intelecto aos impulsos eletrônicos através de computadores, celulares, smartfones, tablets e o que mais haja do gênero. Pode-se chegar assim a uma escravização da mente, que só consegue pensar em conexão com a máquina e estabelecendo com ela um relacionamento de reciprocidade altamente danoso.

É claro que não estamos advogando a abstinência total do uso desses aparelhos. Postas as condições do mundo atual, e enquanto elas durarem, a utilização de tais meios de comunicação e de trabalho pode ser de utilidade. Inclusive pode-se, por meio deles, obter bons frutos, mesmo para causas nobres e elevadas.

Mas isso não impede que, usados tais aparelhos com sofreguidão e apego, podem eles viciar o intelecto e a vontade tanto ou mais que o crack ou a cocaína, produzindo um efeito devastador sobre a personalidade do viciado. É por isso que se deve ter um cuidado especial ao iniciar as crianças nesses “mistérios”, mais problemáticos que os mistérios de Osíris.

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As advertências médicas a esse respeito têm se multiplicado. Reportagem publicada pelo “New York Times” e reproduzida pela “Folha de S. Paulo” (8-7-15) sob o título “Uso de eletrônicos já afeta saúde e desempenho escolar de crianças”, diz:

“O uso em excesso de jogos de computador por jovens chineses parece estar causando danos alarmantes nesses adolescentes. Passam horas por dia de olho nas telas eletrônicas. Médicos do país consideram o fenômeno um transtorno clínico e criaram centros de reabilitação onde jovens ficam isolados de todos os tipos de mídia eletrônica.

“Nos EUA e em outros países ocidentais, os jovens ficam conectados por mais tempo do que o considerado saudável para o desenvolvimento normal. E a relação com a tela começa cedo, quando bebês recebem tablets e celulares para que se entretenham.

“A Academia Americana de Pediatria afirma que uma criança de oito a 10 anos de idade passa em média oito horas por dia com diferentes tipos de mídia eletrônica”. E recomenda que “antes dos dois anos de idade, as crianças não deveriam ser expostas a nenhuma mídia eletrônica, porque ‘o cérebro da criança se desenvolve rapidamente nesses primeiros anos, e crianças pequenas aprendem mais interagindo com as pessoas, não com telas’.

“O uso pesado de eletrônicos pode ter efeitos negativos no comportamento, na saúde e no desempenho escolar dos pequenos. ‘Quanto mais crianças se comunicam por meios eletrônicos, mais elas se sentem solitárias e deprimidas’, diz Kristina E. Hatch, pesquisadora da Universidade de Rhode Island (EUA). As consequências físicas incluem dores nos dedos, pulso, pescoço e nas costas.”

Da obtusão cibernética, livrai Senhor, as nossas crianças!

(*) Gregorio Vivanco Lopes é advogado e colaborador da ABIM