Cultura

Não é nada, não. É só livro!!!

Marcos Caldeira Mendonça 21 de agosto às 21:53

“AH, VAMOS EMBORA, BEM, NÃO É NADA, NÃO, É LIVRO”

Uma carreta lotada tombou na BR 381, derramando toda a carga. Em minutos, uma multidão das redondezas já estava no local, para saquear.

Mais pessoas foram chegando, com um ponto de interrogação na testa tatuado: iogurte, computador, salsicha, cerveja, latas de goiabada, caixotes de abacaxi?

Como bichinhos num pedaço de doce, formigaram em cima do acidente. Viraram e reviraram tudo, com avidez de garimpeiro buscando a grande pedra, mas ninguém carregou nada.

Respeito ao patrimônio alheio? Não, desinteresse mesmo. Por telefone, o motorista recebeu esta ordem da empresa na qual trabalha: “Tem seguro, deixe que carreguem”.

O carreteiro liberou: “Pode levar, gente”. Não era mais furto, era presente, mas, exceto três crianças, ninguém carregou nada.

Frustrada, sem iogurte, computador, salsicha, cerveja e latas de goiabada, a multidão foi embora, deixando para trás montes e montes de caixas.

Romances, biografias, poesias, contos, crônicas: João Cabral, Marcelo Mirisola, Diego Moraes, Affonso Romano, Luís Giffoni, Manuel Bandeira, Santiago Nazarian, Ignácio de Loyola, Dalton Trevisan, Drummond, Machado, Adélia Prado, José Roberto Torero, João do Rio, João Ubaldo, Humberto Werneck…

O local já estava deserto – só o motorista aguardando guincho – quando um carro parou perto. Saiu do veículo um membro da alta cúpula do governo municipal de Itabira.

Olhou, olhou, viu tudo, voltou e disse à mulher dele: “Ah, vamos embora, bem, não é nada, não, é livro”.

O TREM ITABIRANO.