Por Paulo César Régis de Souza (*)
Todo o dinheiro da Previdência Social brasileira está numa nuvem (in cloud, na linguagem atual) do Ministério da Fazenda, que usa e abusa na gestão da política fiscal. Isto vem de longe, desde quando se acabou com o Orçamento da Previdência Social e criou-se o Orçamento Fiscal e da Seguridade Social. A Fazenda tomara gosto na Previdência quando, através da SUSEP, criada em 1966, passou a administrar a previdência complementar aberta, dos planos de Previdência, de capitalização. Todos os R$ 700 bilhões de ativos estão aplicados em títulos púbicos na sustentação da política fiscal.
Em 2003 foi deflagrada a escalada de implosão da Previdência, com a imposição do Empréstimo Consignado, com recursos dos aposentados e pensionistas da Previdência Social para alavancar a política fiscal. Foi na gestão de Antônio Palocci (2003/2006). A garfada nos velhinhos, que hoje devem mais de R$ 100 bilhões a bancos e tamboretes, serviu para isso.
Vieram os Refis da vida, instrumentos da política fiscal, igualmente impostos sem que a Previdência fosse ouvida, que se multiplicaram com Palocci para beneficiar os caloteiros da Previdência nas dívidas administrativa e ativa…
Os sucessos da política fiscal que cresceram o PIB brasileiro, nos dois governos de Lula, não resultaram em vantagens para a Previdência Social, pois o déficit disparou junto com a expansão dos benefícios. Os saques financiaram o equilíbrio fiscal e o déficit público. Na contramão, a Fazenda achatou o reajuste dos benefícios acima do mínimo e concedeu adicionais aos benefícios do mínimo e ampliou a concessão de benefícios sem custeio.
A escalada foi intensificada na gestão de Mantega (2006/2014), o mais longevo dos ministros da Fazenda, quando nomeou um ministro da Previdência, espécie de agente X infiltrado no MPS para implodir de vez a Previdência. Em 2007 foi dado o tiro de misericórdia, que levou para os R$ 400 bilhões (atuais) da Receita Previdenciária para a Receita Federal, com os auditores fiscais, os R$ 450 bilhões (atuais) da dívida ativa para a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, com os procuradores e o contencioso contributivo do Conselho de Recursos para o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais-CARF. Todos foram atrelados aos objetivos macros da política fiscal.
Há 10 anos que as empresas públicas e privadas não seriam mais molestadas com fiscalização e muito menos com o combate a sonegação e a evasão fiscal. Para fazer o que a Fazenda Nacional faz: não cobrar, não importunar o mercado, não chatear os caloteiros e registrar o mais baixo indicador de recuperação de crédito do mundo ocidental. Na China tais cobradores estariam nas galés ou nos subsolos das minas abandonadas! Um golpe que transformou o INSS (uma das maiores autarquias do mundo) em órgão estéril sem acesso a sua receita e sem comando de sua gestão financeira. Uma excrecência administrativa de largo espectro só praticada no Brasil!
Os ministros da Previdência nos mandarinatos de Lula e Dilma, por alguma razão de Estado, deixaram de fazer o essencial. Não tiveram luz própria, altivez, nem brilho. Aceitaram, por conveniência, tudo o que a Fazenda quis, inclusive quando nas duas reformas da Previdencia cassaram o princípio de Bismark de que não poderia haver benefício sem contribuição, criaram os novos funrurais com benefícios com ”tratamento diferenciado, favorecido e subsidiado, em nome da inclusão previdenciária”, e criaram a aposentadoria por tempo de contribuição substituindo o tempo de serviço.
Não demorou muito e os caloteiros foram premiados com uma devastadora desoneração da contribuição sobre a folha de salários, instituída há 93 anos, trocada por ridículas alíquotas sobre o faturamento.
A Previdência foi perdendo mais fôlego e derretendo. Um auxiliar do terceiro escalão discordou da desoneração e foi sumariamente demitido.
A Previdência foi proibida de falar de déficit, sendo este substituído pelo eufemismo da necessidade de financiamento. Ridículo, muito ridículo.
Faltava, entretanto, o pulo do gato mestre.
O ministro da Fazenda do turno que fora a eminência parda dos mandarinatos de Lula como presidente do Banco Central (2003/2011) foi convidado pelo presidente Temer para assumir a Fazenda, após o impedimento da presidente Dilma.
Não anunciou nada e deixou que outros anunciassem a implantação definitiva do Ministério da Fazenda Social. Na Grécia, nos piores momentos da crise de lá, não houve tamanha ousadia. A Grécia tem 13 ministérios e um deles é da Previdência.
Meirelles acabou com o Ministério da Previdência Social, expurgou o Social da Previdência, criou uma Secretaria de Previdência (de estudos e consultoria), mandou o INSS para o espaço indo parar no Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, levou a Dataprev para brigar com o Serpro. O mais importante: carregou os fundos de pensão com seus ativos de R$ 700 bilhões para o controle da Fazenda, continuando a serviço da política fiscal, com aplicações maciças nos títulos públicos.
Anunciou uma reforma da Previdência, desestabilizando os segurados, berrou que sem reforma a Previdência quebraria, acabou com o direito adquirido e a expectativa de direito, fulminou com o ideário de esperanças, instalou o cenário de pânico e incertezas, exigiu idade mínima, não mexeu nos vespeiros dos rurais, dos militares, governos estaduais e prefeituras e não falou no foco da crise da Previdência: seu financiamento, exaurido pela Fazenda e em déficit acentuado.
O desfecho dessa história é que teremos outra reforma da Previdência no futuro governo, que poderá devolver tudo de Previdência a um novo Ministério da Previdência.
Papai do Céu castiga quem abusa dos velhinhos e quem semeia ventos para colher tempestades.
(*) Paulo César Régis de Souza
é Presidente da Associação Nacional dos Servidores Públicos,
da Previdência e da Seguridade Social-Anasps.
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