“Praedicate Evangelium” ponto de chegada e reinício
A nova Constituição Apostólica sobre a Cúria Romana entra em vigor, institucionalizando mudanças que já foram implementadas em grande parte para um organismo que ajuda o Papa em seu serviço à Igreja universal.
Um ponto de chegada e de partida. Ou melhor, de reinício. Com a entrada em vigor hoje, 5 de junho, e festa de Pentecostes, da nova Constituição apostólica “Praedicate Evangelium”, um caminho de reforma que dura quase uma década é completado. Um caminho que tem acompanhado o pontificado do Papa Francisco até hoje e que começou nas discussões das congregações gerais antes do conclave de 2013.
A reforma vem depois daquela estabelecida por João Paulo II (Pastor Bonus, 1988), que por sua vez modificava a promulgada por Paulo VI (Universi regimini Ecclesiae, 1967). A prioridade da evangelização e o papel dos leigos são as ideias principais que ligam a nova Constituição apostólica do Papa Francisco ao Concílio Ecumênico Vaticano II.
Antes de mais nada, um olhar sobre o caminho já percorrido. As reformas – mais por necessidade judicial do que por uma escolha deliberada – começaram com as instituições econômico-financeiras da Santa Sé. Em 2014, Francisco criou o Conselho para a Economia, que tem a tarefa de supervisionar a gestão econômica e supervisionar as estruturas e atividades administrativas e financeiras dos Dicastérios da Cúria Romana. Ao mesmo tempo, Francisco criou a Secretaria para a Economia, que é o Dicastério da Cúria de controle e direção, responsável pela coordenação dos assuntos econômicos e administrativos da Santa Sé e do Estado da Cidade do Vaticano. À Secretaria para a Economia agora também é transferida competência sobre o pessoal, que até agora era de responsabilidade da Secretaria de Estado. Também em 2014, o Papa confiou ao Revisor Geral a tarefa de efetuar a revisão (audit) dos Dicastérios da Cúria Romana, das Instituições vinculadas ou referentes à Santa Sé e das Administrações do Governatorato do Estado da Cidade do Vaticano.
Um segundo passo ocorreu em 2015, com a criação da Secretaria para a Comunicação, que mais tarde se tornou o Dicastério para a Comunicação, que incorporou 9 entidades diferentes (do Pontifício Conselho para as Comunicações Sociais aos vários organismos de comunicaçõ da Santa Sé, da tipografia à Livraria Editora Vaticana). A partir de 2018, o novo Dicastério foi confiado à liderança de um prefeito leigo.
Em 2016, foi instituído o Dicastério para os Leigos, a Família e a Vida, que unificou as competências e funções que haviam pertencido ao Pontifício Conselho para os Leigos e ao Pontifício Conselho para a Família. O Dicastério é competente em assuntos relacionados à promoção da vida e ao apostolado dos fiéis leigos, ao cuidado pastoral da juventude, da família e sua missão, e à proteção e apoio da vida humana.
Em 2016, o Papa instituiu o Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral. Neste Dicastério confluíram as competências do Pontifício Conselho de Justiça e Paz, do Pontifício Conselho Cor Unum, do Pontifício Conselho para a Pastoral dos Migrantes e Itinerantes e do Pontifício Conselho para a Pastoral da Saúde. O Dicastério também é responsável pela Caritas Internationalis.
Em novembro de 2017, o Papa também fez mudanças na Secretaria de Estado, que até então consistia em duas seções, Assuntos Gerais (chefiada pelo Substituto) e Relações com os Estados (chefiada pelo Secretário para as Relações com os Estados). De fato, Francisco estabeleceu uma terceira seção, chamada Seção para o Pessoal Diplomático da Santa Sé, reforçando o atual escritório do Delegado para as Representações Pontifícias. A Seção, que depende da Secretaria de Estado, com seu próprio Secretário, quer demonstrar a atenção e a proximidade do Papa para com o pessoal diplomático. Trata exclusivamente de assuntos relativos às pessoas que trabalham ou se preparam para o serviço diplomático da Santa Sé.
Outro passo foi dado em fevereiro de 2022. Com um Motu proprio, o Papa Francisco mudou a estrutura interna da Congregação para a Doutrina da Fé, separando claramente as competências doutrinárias e disciplinares, estabelecendo duas seções separadas, e designando um secretário para cada uma delas. O cardeal Prefeito do Dicastério terá então dois vices. O objetivo da reforma é dar a devida importância também à seção doutrinária e seu papel fundamental na promoção da fé, sem deixar a atividade disciplinar ficar em segundo plano, após décadas em que muito esforço e recursos humanos foram despendidos para examinar casos de abuso. Nenhum dos dois novos secretários foi nomeado bispo.
Isto nos leva ao dia 19 de março de 2022, com a publicação da nova Constituição, que abrange todo o caminho descrito até agora e introduz outras novidades que completam a reforma. O mais importante: o primeiro dicastério da Cúria é o para a evangelização, que unifica a Congregação para a Evangelização dos Povos e o Pontifício Conselho para a Nova Evangelização. Uma escolha que indica a preocupação fundamental, voltada para a proclamação do Evangelho. A peculiaridade é que o prefeito deste dicastério torna-se o próprio Papa, que considera o tema da evangelização crucial. Ele será assistido por dois pró-prefeitos (um para a seção de questões fundamentais da evangelização no mundo; e outro para a seção para a primeira evangelização e as novas Igrejas particulares).
A segunda novidade refere-se à unificação no novo Dicastério para a Cultura da ex-Congregação para a Educação Católica e do ex-Pontíficio Conselho para Cultura. Terá um único prefeito. Uma terceira novidade da Constituição é a transformação da Esmolaria apostólica, até hoje um simples escritório, que se torna agora o terceiro Dicastério da Cúria romana chamado “Dicastério para o serviço da caridade”. Uma quarta novidade é a definição com a qual é citado um organismo que não faz parte da Cúria romana: a que até o momento era chamada “Secretaria geral do Sínodo dos Bispos”, agora se torna simplesmente “Secretaria geral do Sínodo”.
Outra novidade da Constituição é representada pelo fato de que os chefes de Dicastério – nem mesmo aqueles das antigas congregações – não precisam mais ser cardeais. Os únicos dois cardeais mencionados no “Praedicate Evangelium” são o Prefeito do Tribunal da Assinatura Apostólica e o coordenador do Conselho para a Economia. O Papa também estabeleceu que as nomeações para clérigos e religiosos na Cúria sejam por cinco anos, renováveis por um segundo período de cinco anos, com maior mobilidade e intercâmbio entre Roma e as Igrejas locais.
Finalmente, há um elemento significativo da nova Constituição destinado a condicionar, em seus futuros desenvolvimentos, também a concretude da vida das Igrejas locais e de suas estruturas. O Papa Francisco recorda no Preâmbulo da Constituição que “Todo cristão, em virtude do Batismo, é um discípulo missionário na medida em que encontrou o amor de Deus em Cristo Jesus”. Daí o envolvimento de leigos e leigas em papéis de governo e responsabilidade. Se “qualquer fiel” pode presidir um Dicastério ou um organismo curial, “dada sua particular competência, poder de governo e função particular”, é porque cada instituição da Cúria age em virtude do poder que lhe foi confiado pelo Papa.
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