Relações de trabalho no campo gerou forte debate entre deputados, Ministério Público do Trabalho e produtores de Alfredo Wagner.
Há mais de cinco anos, as 15 mil famílias produtoras de cebola na região de Alfredo Wagner, no Alto Vale, convivem com um fator preocupante em sua rotina de trabalho: o medo da fiscalização e das multas do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que exige as mesmas condições de contratação do regime celetistas para os trabalhadores temporários nas lavouras, nos períodos do plantio e da colheita, que duram apenas dois meses no ano. Sem condições de cumprir as exigências, os agricultores buscam uma solução para o impasse com apoio dos deputados estaduais. A batalha entre cebolicultores, MTE e Ministério Público do Trabalho (MPT) ganhou um novo capítulo nesta segunda-feira (30), com a realização de uma audiência pública promovida pela Assembleia Legislativa, por meio de suas comissões de Trabalho e de Agricultura.
Depois de quatro horas de discussão, os mais de mil agricultores presentes aceitaram a proposta da criação de um grupo de trabalho, composto por deputados, prefeitos e representantes de sindicatos rurais da região em parceria com o MTE, para revisar a legislação específica para o trabalho rural e buscar regras condizentes com a realidade da atividade agrícola no Alto Vale. A primeira reunião do grupo será nesta quarta-feira (2), às 14 horas, em Florianópolis.
Além da revisão na legislação, os deputados pediram que a fiscalização cesse termporariamente, enquanto as novas regras são definidas. “Queremos que sejam aplicados os benefícios da lei para os agricultores e não apenas os rigores da lei, como se vê aqui na região. Os agricultores são tratados como bandidos ao receberem os fiscais acompanhados pela Polícia Federal, o que é desnecessário”, disse o deputado Marcos Vieira (PSDB), proponente da audiência pública e presidente da Comissão de Trabalho.
Esta é uma das maiores queixas dos produtores: além das multas, alegam que são desrespeitados e hostilizados pelos fiscais do MTE. Após serem autuados, a maioria assina um termo de ajustamento de conduta com o Ministério Público do Trabalho (MPT). Os agricultores, porém, não têm condições de cumprir as exigências da Lei Federal 11.718, que estabelece as normas para contratação temporária no campo, e da NR 31, que determina as regras de saúde e segurança para o trabalhador rural.
“Muitas cópias de autuação têm chegado aos gabinetes dos deputados, com valores que variam de R$ 4 mil a R$ 30 mil”, observou Marcos Vieira, que pontuou algumas exigências do MPT impostas aos agricultores, como alojamentos, áreas de vivência com instalações sanitárias, lavanderia, refeitório, água potável, instalações elétricas, primeiros socorros, equipamentos de proteção individual, jornada de trabalho, exames periódicos e demissionais. “Propomos a suspensão das autuações até encontrarmos a solução em favor dos agricultores”, pediu o parlamentar.
Forte debate
O procurador-chefe do Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina, Egon Koerner Júnior, ouviu os apelos dos deputados e agricultores e não concordou com a cessão da fiscalização, dizendo que o MP não pode deixar de cumprir sua função e cobrar o que pede a legislação. Argumentou que a presença da Polícia Federal é para garantir a segurança e a vida dos fiscais que correm risco no exercício da sua função.
“Não é possível suspender e nem posso fazer isso. O que se está propondo aqui não é viável. Estão querendo nos empurrar responsabilidades. Nós vamos continuar autuando porque somos pagos para isso. Gostaria que o deputado estivesse junto numa fiscalização sem a Polícia Federal para conhecer as ameaças que os fiscais sofrem”, disparou. Interrompendo as vaias da plateia ao representante do MPT, o deputado Marcos Vieira argumentou com o procurador-chefe que, da mesma forma como o MPT propõe o ajustamento de conduta aos agricultores, pode interferir em favor deles, mas Koerner discordou. “O MPT continuará a cumprir sua obrigação até que se mude a lei”.
Grupo de Trabalho
O Superintendente Regional do Trabalho em Santa Catarina, Luiz Viegas, representante do Ministro do Trabalho, Manoel Dias, afirmou que não medirá esforços na busca de uma solução para o impasse. “O ministro tem o respaldo da Presidência da República. Vamos trabalhar e discutir com esta comissão formada, que ela seja o mais ampla possível para chegarmos a solução”, prometeu Viegas, que também afirmou que vai “rever os autos de fiscalização”.
O deputado Moacir Sopelsa (PMDB), que preside a Comissão de Agricultura, disse que a característica da agricultura familiar é marcante no estado e na região, uma cultura que não pode ser perdida. “Nossos produtores aqui são responsáveis por 30% da produção de cebola no Brasil. A grande maioria das famílias planta pouco mais de um hectare”.
Participaram da audiência pública os deputados Dirceu Dresch (PT), Jorge Teixeira (PSD), Aldo Schneider (PMDB) e Dirce Heiderscheidt (PMDB). Entre as autoridades, muitos vereadores da região e os prefeitos e vice-prefeitos de Alfredo Wagner, Ituporanga, Aurora e Imbuia. Presidentes dos sindicatos rurais e órgão da agricultura familiar também marcaram presença.
“Não é correta a forma como estão sendo tratados nossos agricultores nas propriedades, como bandidos. Os fiscais vêm armados, passando com o carro por cima das lavouras. Já sugerimos há alguns anos um trabalho de conscientização e orientação, mas o Ministério do Trabalho não fez isso”, reclamou Marcos Rosar, presidente do Sindicato da Agricultura Familiar de Alfredo Wagner.
Maior produção de cebola de SC
Alfredo Wagner divide com Ituporanga, também no Alto Vale do Estado, o título de maior produtor de cebola de Santa Catarina. A região é responsável por 91% de toda a produção de cebola catarinense. São 20 mil hetares plantados e 15 mil famílias produtoras. O plantio ocorre no mês de agosto e a colheita em dezembro, quando chove muito.
Por isso, produtores como Vilmo Lopes, de Imbuia, contratam mão-de-obra temporária apenas no período. Ele paga por produção e diz que é impossível estabelecer jornada de trabalho. “Chove bastante em dezembro e precisamos colher. Quando não chove, precisamos trabalhar o maior período possível. Por isso, gostaríamos de poder contratar por hora de trabalho. Eu sei quantas pessoas preciso e quantas horas de trabalho cada um terá”, explica o agricultor.
Vilmo confessa que não registra todos os funcionários, que ganham, em média, R$ 150 por mil pés de cebola plantados ou colhidos. “Não quero mais fugir ou me esconder. Quero dizer para as minhas filhas que elas podem continuar na roça. Hoje eu tenho medo de ir para a roça”. O agricultor já recebeu multa de R$ 5 mil e assinou o termo de ajustamento de conduta com o MPT.
Rony Ramos – AGÊNCIA AL
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