Os preços de imóveis, para alugar ou vender, em Alfredo Wagner, sempre foram muito altos, mas participam desta bolha prevista para estourar nos próximos anos? Há cinco anos atrás era mais barato adquirir um imóvel na Beira Mar Norte que na praça… Hoje, estará assim? Alguém que tenha um imóvel para vender, deve acompanhar o aumento da bolha ou vender pelo valor que terá quando esta bolha estourar?
Pronto: já temos a maior bolha imobiliária da história da humanidade
Alexandre Versignassi 22 de janeiro de 2014
A bolha mais violenta de todos os tempos foi a do Japão. Entre 1985 e 1991 os preços dos imóveis subiram 180%, em média, nas maiores cidades de lá. Quase uma triplicada em seis anos. Mas agora já era. Deixamos os japoneses para trás: em São Paulo, foram precisamente 181% de aumento, em seis anos também – de 2008 para cá. No Rio, 225%. Chupa, Japão.
Mas falando sério: tem quem ache que isso nem é uma bolha, só um ajuste natural. Faz sentido, até: nenhum país que viveu uma bolha para valer tinha acabado de sair de quase uma década de hiperinflação, estagnação e sarneyzação – um limbo econômico que manteve o valor dos nossos imóveis bem baixos em relação aos dos “países nobres”, só pra usar o termo que o mercado imobliário aplica a bairros, e que entrou para o léxico de todo mundo. Levando isso em conta, simplesmente comparar nosso aumento percentual de hoje com o do Japão dos anos 80 acaba passando uma ideia imprecisa do que é uma bolha de gente grande.
E uma bolha de gente grande é o seguinte: quando o preço dos imóveis no Japão estava só começando a inflar, em 1985, o metro quadrado em Tóquio já custava R$ 28 mil, em valores de hoje. Bem mais que o do Leblon (R$ 20 mil) ou o da Vila Nova Conceição, o mais caro de São Paulo hoje (R$ 14 mil). Isso porque o Japão já tinha tido seus anos de crescimento chinês, e o PIB continuava bombando na faixa de 4%, 5% ao ano. De quebra, o país via sua renda média por habitante superar a dos EUA, roçando no equivalente a R$ 5 mil por mês. Nisso, o yene começou a valorizar demais. Quando a moeda valoriza, os exportadores se trumbicam, já que os produtos que eles vendem acabam mais caros no exterior. O governo, então, passou a imprimir cada vez mais yenes para ver se o preço da moeda baixava. E forçou a entrada desse dinheiro novo na praça mantendo os juros reais em 0% – o juro nominal era de 2,5%, mas a inflação também. Então o juro para valer era zero mesmo. Com crédito sobrando, o mercado imobiliário pegou fogo.
E seis anos depois o metro quadrado de Tóquio estava batendo nos R$ 80 mil. R$ 4 milhões por qualquer biboca de 50 metros quadrados… Isso na média. Os picos eram bem mais surreais. No distrito de Ginza, a Oscar Freire deles, chegaram a negociar imóveis comerciais por R$ 2 milhões o metro quadrado. O metro quadrado. Foi nessa época que apareceu aquela lenda urbana, a de que o terreno do Palácio Imperial valia mais do que todos os imóveis da Califórnia (o que devia dar uns três Brasis daquela época…). Valia mesmo. Aí estava claro: os preços japoneses tinham violado de vez a realidade. Imobiliária Salvador Dalí.
Nossos preços de agora também têm flertado com o surrealismo. Quando a gente aqui na Super fez uma matéria de capa sobre a obesidade dos preços no Brasil, em abril de 2013, o apartamento mais caro do país era uma cobertura quadriplex nos Jardins – um daqueles palácios suspensos com 900 vagas na garagem, heliponto e o Chuck Norris de segurança. Custava R$ 35 milhões. Agora o buraco está mais em cima: Paula Lavigne colocou o apartamento em que ela morou com o Caetano, no fofo edifício JK, em Ipanema, por R$ 37 milhões. Como a apto tem 750 m2, dá R$ 49 mil o metro quadrado. E olha só: ainda assim é menos que o m2 da Tóquio dos anos 80. Também é bem menos que outro apartamento na orla de Ipanema, anunciado neste ano por R$ 66 milhões. Este, de 600 m2, acaba batendo a média do auge da bolha japonesa – já que custa quase R$ 100 mil o metro quadrado. Recorde histórico, mas ainda uma migalha perto dos preços mais altos do Japão de 30 anos atrás.
Quando saiu a notícia desse apartamento sendo vendido por R$ 66 milhões, aliás, uma comparação recorrente foi dizer que “por esse preço daria para comprar um apartamento perto do Hyde Park, em Londres”. Big shit: a orla Ipanema-Leblon é, arguably, a região urbana mais bonita do mundo – sem falar que o Rio tem um PIB bem razoável: US$ 130 bilhões, igual ao de Hamburgo, na Alemanha.
Então, sim, uma parte dos nossos preços surreais é só uma adequação à própria realidade. Mas isso não significa que a bolha não exista.
E a maior evidência dela não está nos Jardins ou no Leblon. Está no fato de o milhão de reais ter virado a unidade básica da economia imobiliária. Para entender o que isso tem de ridículo, não precisa levar em conta que a renda média no Brasil é de R$ 1.500. Todo mundo sabe que a gente vive num regime quase escravocrata. O que impressiona é que nem os senhores de escravos têm como lidar com esses preços. A renda média do 1% mais rico do país é de R$ 18 mil. Um contra-cheque confortável para os padrões nacionais, óbvio, mas mesmo assim longe do suficiente para comprar nossas bibocas de mais de um milhão de reais sem apertar o cinto. Aí não tem jeito: ou você é do 0,01% mais endinheirado ou está fora desse show do milhão. Pior: quem mais ajuda a inflar nossa bolha é justamente parte do 0,01%: investidores que compram imóveis de baciada para revender depois. Ok. É do jogo: o mercado tem de ser livre mesmo. Mas, num país em que o dinheiro grosso não está nem no topo da pirâmide, mas numa agulha fincada nesse topo, esse jogo é mais arriscado do que parece. Trata-se simplesmente de um mercado pequeno demais para sustentar a alta. E quem diz não sou eu, mas o Robert Shiller, que ganhou o Nobel de economia justamente por ter previsto a bolha imobiliária de 2006 nos EUA (uma mais suave que aquela do Japão, mas que levaria à crise sistêmica de 2008): “Os preços só sobem. Todo mês”, Shiller disse recentemente, sobre o nosso mercado imobiliário. “O que justifica isso, fora o puro entusiasmo? Era exatamente o que eu dizia nos Estados Unidos em 2005. Não quero criar pânico, mas não custa avisar.” Não, não custa.
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