Leitor, leitora, quero convidá-los a um passeio pelo tempo em busca de uma época muito diferente da nossa. Vamos acompanhar duas famílias que se encontraram aqui em nosso município há muitos anos atrás. Estes fatos aconteceram, com certeza, mas uns separados dos outros, provavelmente um ou outro ocorreu simultaneamente, mas, como é Natal, vamos reuni-los num conto baseado em fatos reais. Espero que a lição de Natal que Cristo nos trouxe, infunda profundamente em seu espírito e graças abundantes o acompanhem por toda a vida.
Era o final do Século XIX e começo do Século XX. Uma família é migrante e não tem parada definitiva, ela vive viajando, são Xoklengs, descendentes do tronco Jê, que descem para o litoral em busca de alimentos abundantes no verão.
A outra, é uma família que descende de imigrantes que vieram da Alemanha. Ela sobe a serra em busca de novas terras para a agricultura.
Os caminhos são íngremes para as duas famílias. mas os Xoklengs tem muito mais vantagem! Eles conhecem a mata, sabem onde mora o perigo. Eles conhecem o caminho: seus antepassados já percorreram o mesmo trajeto há muitos e muitos anos.
Os imigrantes desconhecem os perigos, mas estão sempre atentos para o bote da onça ou da cascavel. Eles desconhecem o caminho, seguem uma picada aberta no facão. Caminham cantando canções religiosas, inundando a mata com suas vozes fortes.
Os índios, povo guerreiro e que não admite invasores, subitamente param e prestam atenção. Acostumados aos sons da floresta, ficam paralisados por vozes diferentes, cantando. Nada entendem. Povo poliglota, facilmente decoram algumas das palavras cantadas.
A noite que se aproxima obriga imigrantes e índios a parar próximos ao grande rio que deverão cruzar. Cada povo para num dos lados e ali acampa. Uns começam a observar os outros e o rio que os separa é uma segurança para ambos.
Os imigrantes, descendentes de alemães montam acampamento sempre cantando. Entre eles está uma mulher grávida. Os índios perceberam isto e chamam uma de suas integrantes que também espera um filho e apontam para os recém-chegados. Estes, do outro lado do rio observam o movimento e notam neste gesto um desejo de aproximação.
Os brasileiros descendentes de alemães, que ali se encontravam, são altos, branquelos, em geral loiros. Os Xoklengs, baixinhos, pele cor de caramelo e muito ágeis. A curiosidade por uns e outros é tanta que até esquecem seus afazeres e a noite cai. Comem rapidamente, e se recolhem. Os imigrantes vão para suas barracas e os índios se acomodam em abrigos já preparados anteriormente.
O dia seguinte seria de muita agitação em ambos acampamentos. Imigrantes e índios pretendem continuar viajem mas, dificilmente iriam muito longe com as mulheres prestes a dar a luz. As dores do parto atingem as duas! Poucas mulheres entre os imigrantes sabem realizar um parto. Os imigrantes, consultam mapas, bussolas e decidem ficar no local mais tempo. Comentam entre si o fato dos índios terem ali um abrigo o que indica terra boa, protegida e segura. Sem que os alemães se deem conta, um dos índios mais velhos se aproximou por trás e os observa a utilizar os mapas e pouco entende o que está acontecendo mas intui logo do que se trata.
Quando os imigrantes percebem sua presença, o índio lhes estende uma perdiz recém-capturada e aponta para a mulher grávida. Pegos de surpresa e sem ter com o que retribuir tal gesto de boa vontade do xokleng, eles oferecem um pedaço de cuca assado numa das paradas da viajem. O índio gosta e pede mais. Leva para a tribo que do outro lado do rio sorri!
A tarde permaneceu calma, exceto para as parturientes que gemiam de dor. Duas índias velhas, de pele enrugada e com apenas um pano cobrindo a cintura, se aproximam para ajudar a jovem mulher branca prestes a dar à luz. Com gestos tranquilizam a mulher e aos poucos a posicionam para um parto rápido e tranquilo. As mulheres a sua volta observam e comentam, os homens se retiram, vão bebericar uma aguardente, pois a noite, vagarosamente vai caindo.
Um deles, amansando quanto pode sua poderosa voz, começa a cantar uma canção que aprendera com um parente recém-chegado: Stille Nacht… O Noite Feliz pela primeira vez ecoa pelas florestas da Serra! A fogueira acessa, os cânticos se sucedem, xoklengs e imigrantes partilhando a aguardente, comendo cuca com banana (ideia de um dos índios…) e lá pelas tantas o choro dos recém nascidos se mistura ao barulho da festança. Frohe Weihnachten! Exclama um dos mais velhos entre os imigrantes, Feliz Natal! É noite de Natal na mata. É o primeiro Natal dos Xoklengs!
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